segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

A responsabilidade civil por abandono afetivo paterno-filial



O direito de família foi o ramo do direito privado que mais necessitou de mudanças após a Constituição Federal de 1988 e conseqüentemente foi o que mais sofreu mudanças. Diante da premente necessidade de acompanhar a evolução dos costumes sociais, o legislador adequou a norma para satisfazer os anseios sociais.
            Umas das importantes mudanças no direito de família é a relação entre pais e filhos, no tocante a direitos e deveres.
            A inserção do princípio da dignidade da pessoa humana no ordenamento jurídico brasileiro mudou a visão do poder familiar, deu mais proteção e respeito entre os entes da unidade familiar.
            Desse modo, sob o prisma do princípio da dignidade da pessoa humana, alguns doutrinadores passaram a entender ser possível a reparação de dano moral por uma negativa afetiva paterno-filial.
Diante de tal questão, surge a perplexidade ao ver renomados doutrinadores cogitar uma reparação civil por abandono afetivo paterno-filial, vez que esses usam a falta de afeto para fundamentar tal pretensão.
            Dizer que o filho que crescer sem afeto poderá vir a sofrer um dano moral, é correto, mas dizer que esse dano moral poderá ser indenizado pecuniariamente pelo genitor é dar ao afeto caráter normativo, dando ao direito o poder de interferir no subjetivo humano.
O direito tem o poder e o dever de regulamentar as ações humanas, não de intervir no íntimo de cada um. Dizer se um pai deve ou não amar seu filho, é interferir na subjetividade do mesmo, não devendo o direito adentrar nesta seara.
O afeto, ou a falta dele não poderá ser fundamento jurídico para uma pretensa reparação civil. Dar ao afeto uma condição de norma jurídica é descaracterizar a própria condição do sentimento, a liberdade de ter afeto ou não por outrem.
                A responsabilidade civil e o direito de família são institutos jurídicos diferentes, separados pelo Código Civil de 2002. A aplicação da responsabilidade civil será admitida nas relações familiares, porém apenas no tocante ao que não for regulamentado no poder familiar.
                O poder familiar determina quais são os direitos e deveres na relação paterno-filial e, para as ações ou omissões praticadas nesta relação há a punição de suspensão ou perda do poder familiar previstas no direito de família. Punir o genitor com a perda ou suspensão do poder familiar e responsabilizá-lo por negar afeto ao filho, seria puni-lo duas vezes pela mesma conduta.
                Porém admitindo-se que a responsabilidade civil poderá ser aplicada ao direito de família, ignorando as sanções previstas no poder familiar, deve-se observar todos os elementos da responsabilidade civil.
                O ato ilícito culposo é de difícil caracterização na problemática em apresso, vez que mesmo depois de ignorar todas as excludentes de ilicitude, o afeto ainda continuará tendo poder de norma jurídica, dando ao direito atribuições que este não tem, ou seja o de regulamentar um sentimento.
                Para cogitar a reparação de um dano moral por negativa afetiva paterno-filial, consequentemente deverá haver o dano. A análise da existência do dano deverá ser feita por profissional qualificado, mas mesmo sendo ele caracterizado, a sua reparação pecuniária não surtirá o efeito desejado.
                Contudo, diante das mudanças no direito de família, foram admitidos vários modelos familiares e, admitir que a ausência afetiva do genitor é o único fator que poderá gerar um dano moral, é ir contra os novos modelos familiares aceitos. Não existe um modelo de família a ser seguido e, independente da ausência de afeto de um ente, outros membros da unidade familiar serão capazes de suprir essa ausência.
                Vê-se que o nexo de causalidade também encontra problemas para sua caracterização. O dano moral não poderá ser imputado a somente um fator, então é juridicamente incorreto responsabilizar somente uma pessoa por esse dano.
                Diante das alegações expostas, fica evidente que o dano proveniente da falta de afeto paterno-filial, é fruto de uma lesão psicológica. Logo, reparar pecuniariamente esse dano não ira resolver a lesão propriamente dita e alem de tudo, criaria uma possibilidade de enriquecimento sem por parte do filho.
                Para não ter o perigo de criar-se uma aberração jurídica admitindo a reparação civil de um dano moral proveniente de abandono afetivo paterno, ou enriquecimento sem causa por parte do filho, coerente seria a reparação psicológica através de seções com um terapeuta especializado. Isso, caso fosse detectado o dano e se esse fosse proveniente da falta de afeto por parte do genitor.

Nenhum comentário:

Postar um comentário